Por Luísa Carolina Aki Toyoshima e Thiago Vieira de Almeida Prado
Um novo modelo contratual para investimento em startups – o contrato de investimento conversível em capital social (“CICC”) – é o objeto da proposição do Projeto de Lein. 252/2023 (“PL”), autuado no Senado pelo senador Carlos Portinho, que possui o objetivo de complementar o Marco Legal das Startups e do Empreendimento Inovador (Lei Complementar n. 182/2021, o “Marco Legal das Startups”).
Tornar o mercado brasileiro mais favorável aos negócios inovadores e às startups é sonho antigo e que avança a passos lentos. O Marco Legal das Startups foi promulgado com o objetivo de impulsionar esta meta, ainda que de forma tímida, autorizando a realização de aportes de capital em startups, por pessoas físicas e jurídicas, que poderão ou não serem convertidos em participação societária.
De forma não exaustiva, a norma pontua a debênture conversível, emitida pelas sociedades por ações, e o contrato de mútuo conversível em participação societária, bastante utilizado no Brasil para formalizar investimentos entre investidores e startups que adotam o regime jurídico das sociedades limitadas, como instrumentos conversíveis para a captação de recursos (equivalentes ao convertible note americano). Outros modelos de contrato envolvendo a possibilidade de aporte na startup previstos na legislação são o contrato de opção de subscrição ou compra de participação e o contrato de investimento-anjo.
Inspirado no contrato denominado Simple Agreement for Future Equity (SAFE), criado pela aceleradora de startups norte-americana Y Combinator, de acordo com a redação originária do PL, o CICC é um contrato de investimento por meio do qual o investidor transfere recursos conversíveis em capital social à startup. Difere-se do mútuo conversível por não possuir natureza de dívida, já que, em regra, a conversão em participação societária ocorrerá de forma automática, não havendo a opção de resgate dos valores pagos pelo investidor, salvo na ocorrência de algum evento de liquidez. No CICC, os valores aportados pelos investidores não serão considerados passivos contábeis da startup, diferente do que ocorre no mútuo conversível em que o investidor ocupa posição de credor enquanto a startup de devedora.
Apesar de estar previsto no Marco Legal das Startups, não há normas legais que regulamentem o contrato de mútuo conversível em participação societária. Assim, neste tipo de operação, aplicam-se os arts. 586 e 592 do Código Civil, que tratam do contrato de mútuo, compreendido como o simples empréstimo de coisa fungível. Quando convertido em participação em participação societária, o mútuo conversível se realizará mediante dação em pagamento, que se aperfeiçoará quando o credor anuir receber prestação diversa da que lhe é devida.
Como se pode verificar, tal ausência de regulamentação legal específica submete as operações de mútuo conversível a um cenário de insegurança jurídica, pois sujeita a análise destas à aplicação de normas gerais que desconsideram as particularidades existentes na relação entre investidor e startup. Este cenário de instabilidade pode ser especialmente agravado quando da discussão judicial destes contratos, o que abriria um espaço maior à subjetividade do magistrado.
Assim, a regulamentação do CICC é importante por conferir maior previsibilidade às relações desta natureza, sendo importante frisar que a instituição desta espécie contratual não descarta a possibilidade de que os mútuos conversíveis continuem sendo celebrados. Apesar disso, entendemos o CICC tende a ser bem recebido pelo mercado, por conta da liberação da startup da responsabilidade de pagamento de investidores na hipótese de não conversão da participação societária. Poderá, portanto, a startup direcionar sua atenção às atividades focadas em seu desenvolvimento e crescimento.
Ainda que a liberação acima represente um aumento no risco da operação para os investidores, considerando os escopos mais arrojados e o estágio de maturidade inicial que rodeiam este tipo de sociedade, este novo cenário parece melhor se adequar à contratação, sendo esperado que os investimentos em startups envolvam um risco maior se comparados aos investimentos em empresas tradicionais. Nesse sentido, em contrapartida ao alto risco assumido, pontua-se a expectativa do investidor em receber futuramente a participação societária de uma empresa com alto potencial de crescimento.
Para concluir, do ponto de vista societário e contratual, a proposição do PL nos parece uma ótima iniciativa do legislador para o fomento de investimentos na seara das startups. Apesar disso, o texto original do PL nos parece bastante simples, sendo esta a oportunidade perfeita para a realização de ajustes e inclusões que tornem mais robusta e técnica a regulamentação do CICC. Com este objetivo, foi apresentada, pelo Presidente do Senado Rodrigo Pacheco, emenda ao PL, em 18 de abril de 2024, cuja redação final foi submetida à apreciação da Câmara dos Deputados, casa revisora.
O BVP Advogados conta com um time preparado para atender as diversas demandas do mercado de startups e empresas de tecnologia, desde a definição da estratégia tributária até a condução de todos os trâmites societários para a operação.
Para manter nosso cliente amparado e atualizado, seguiremos acompanhando a tramitação do PL e à disposição para esclarecer quaisquer dúvidas sobre o tema.