por Bruna L. B. Rocha Gravena e Ana Paula Silva Lazzuri
As pessoas jurídicas sujeitas ao regime não cumulativo das contribuições para o PIS e para a Cofins, poderão apurar créditos na forma prevista nos artigos 3º da Lei nº 10.637/2002 (PIS) e artigo 3º da Lei nº 10.833/2003 (Cofins).
Dentre as hipóteses de aproveitamento de créditos trazidas pela legislação do PIS e da Cofins, está a possibilidade de descontar créditos em relação aos bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, exceto nos casos descritos em lei.
Contudo, a legislação não traz de forma clara e precisa a definição ou o conceito de “insumo” para fins de apuração de crédito do PIS e da Cofins.
Diante da citada omissão, o STJ, em 2018, no julgamento do RESP nº 1.221.170/PR, sob o rito dos recursos repetitivos, firmou a seguinte tese: “o conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios de essencialidade ou relevância, ou seja, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado item — bem ou serviço — para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte”.
No julgamento, o então relator ministro Napoleão Nunes Maia Filho, considerou em seu voto que o critério da relevância é identificável no item cuja finalidade, embora não indispensável à elaboração do próprio produto ou à prestação do serviço, integre o processo de produção, seja pelas singularidades de cada cadeia produtiva ou por imposição legal.
No mesmo ano, a RFB editou o Parecer Normativo Cosit nº 5/2018, que tem por finalidade apresentar os reflexos decorrentes da definição do conceito de insumo estabelecida no julgamento do RESP nº 1.221.170/PR pelo STJ, considerando que 1) o critério de essencialidade diz respeito ao item do qual dependa fundamentalmente o produto ou o serviço; 2) o critério de relevância diz respeito ao item cuja finalidade integre o processo de produção, ainda que não indispensável ao produto ou prestação de serviços, inclusive pela singularidade de cada cadeia produtivo ou por imposição legal; 3) não podem ser considerados como insumos itens que não estejam relacionados com as atividades de produção de bens e da prestação de serviços, como ocorre com as despesas com os setores administrativo, contábil, jurídico e etc.
Por conseguinte, em 2019, a Receita Federal do Brasil emitiu a Instrução Normativa RFB nº 1.911/2019, convalidando a tese firmada pelo STJ e reconhecendo que o conceito de “insumo” deve ser aferido de acordo com os critérios da essencialidade ou da relevância no processo de produção ou fabricação de bens destinados à venda ou de prestação de serviços, nos termos do artigo 172:
“Artigo 172. Para efeitos do disposto nesta Subseção, consideram-se insumos os bens ou serviços considerados essenciais ou relevantes, que integram o processo de produção ou fabricação de bens destinados à venda ou de prestação de serviços (Lei nº 10.637, de 2002, artigo 3º, caput, inciso II, com redação dada pela Lei nº 10.865, de 2004, artigo 37; e Lei nº 10.833, de 2003, artigo 3º, caput, inciso II, com redação dada pela Lei nº 10.865, de 2004, artigo 21) (…)”.
Contudo, o artigo 172 da IN/RFB nº 1.911/2019, traz ainda uma lista de bens e serviços que não podem ser considerados como insumo, dentre eles, as despesas destinadas a viabilizar a atividade da mão de obra empregada no processo produtivo, como alimentação, vestimenta, transporte, cursos, plano de seguro e seguro de vida, bem como as despesas com atividades administrativas, contábeis e jurídicas da pessoa jurídica:
“§2º Não são considerados insumos, entre outros:
I – bens incluídos no ativo imobilizado;
II – embalagens utilizadas no transporte do produto acabado;
III – bens e serviços utilizados na pesquisa e prospecção de minas, jazidas e poços de recursos minerais e energéticos;
IV – bens e serviços aplicados na fase de desenvolvimento de ativo intangível que não chegue a ser concluído ou que seja concluído e explorado em áreas diversas da produção ou fabricação de bens e da prestação de serviços;
V – serviços de transporte de produtos acabados realizados em ou entre estabelecimentos da pessoa jurídica;
VI – despesas destinadas a viabilizar a atividade da mão-de-obra empregada no processo de produção ou fabricação de bens ou de prestação de serviços, tais como alimentação, vestimenta, transporte, cursos, plano de seguro e seguro de vida, ressalvado o disposto no inciso VI do artigo 181;
VII – bens e serviços utilizados, aplicados ou consumidos em operações comerciais; e
VIII – bens e serviços utilizados, aplicados ou consumidos nas atividades administrativas, contábeis e jurídicas da pessoa jurídica.
§3º Para efeitos do disposto nesta Subseção, considera-se:
I – serviço qualquer atividade prestada por pessoa jurídica a outra pessoa jurídica mediante retribuição; e
II – bem não só produtos e mercadorias, mas também os intangíveis”.
Em análise ampla da legislação acima, recentemente, a RFB emitiu as Soluções de Consulta — Disit nº 6.026/2021 e 6.027/2021, na qual reconheceu que as despesas com vale-transporte ou contratação de empresa para transporte de funcionários da pessoa jurídica podem ser consideradas como insumo para fins de apuração de créditos para o PIS e para a Cofins, por serem despesas decorrentes de imposição legal, desde que atendidos os requisitos da legislação de regência.
Nota-se que foram convalidadas pelas SCs nº 6026 e 6027 de 2021, apenas as apropriações de créditos em relação às despesas com vale-transporte e com a contratação de pessoa jurídica para transporte de funcionários no trajeto de ida e volta ao local de trabalho, desde que tais funcionários trabalham no processo de produção de bens, uma vez que trata-se de despesas decorrentes de imposição legal, em respeito ao critério da relevância. Além disso, não foram reconhecidas como insumo as despesas com alimentação de funcionários, ainda que estes trabalham no processo produtivo de bens.
Frisa-se que o vale-transporte apenas foi reconhecido como insumo diante da análise do critério de relevância, por tratar-se de despesa decorrentes de imposição legal.
O novel entendimento da Receita Federal abriu caminhos para novas discussões acerca da possibilidade de apuração de créditos de PIS e Cofins decorrentes de despesas oriundas de imposição legal, a partir da aplicação do critério da relevância.