Por Bruna Luiz de Barros Rocha Gravena e Ana Paula Silva Lazzuri
A 1ª seção do Superior Tribunal de Justiça iniciou o julgamento do EAREsp 1.775.781/SP, que trata da possibilidade de creditamento de ICMS sobre despesas com produtos intermediários. O julgamento já teve um voto favorável ao contribuinte por parte da Ministra Regina Helena Costa e atualmente está na conclusão aguardando voto do Ministro Herman Benjamin, que pediu vista.
A tese discute a possibilidade de aproveitamento de créditos de ICMS sobre as despesas produtos intermediários aplicados no processo produtivo ainda que estes produtos não sejam fisicamente incorporados ao produto final, com esteio na disposição contida no art. 20 da Lei Kandir. A discussão central é a necessidade de o produto intermediário integrar ou não fisicamente o bem, para fins de aproveitamento de crédito.
O art. 20 da Lei Kandir (Lei Complementar nº 87/1996), prevê que é assegurado ao contribuinte creditar-se do ICMS na entrada de mercadoria no seu estabelecimento, inclusive quando destinada ao seu uso e consumo, sendo vedado o aproveitamento de créditos que se refiram a mercadorias ou serviços alheios à atividade do estabelecimento, nos seguintes termos:
Art. 20. Para a compensação a que se refere o artigo anterior, é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação.
§ 1º Não dão direito a crédito as entradas de mercadorias ou utilização de serviços resultantes de operações ou prestações isentas ou não tributadas, ou que se refiram a mercadorias ou serviços alheios à atividade do estabelecimento.
§ 2º Salvo prova em contrário, presumem-se alheios à atividade do estabelecimento os veículos de transporte pessoal.
§ 3º É vedado o crédito relativo a mercadoria entrada no estabelecimento ou a prestação de serviços a ele feita:
I – para integração ou consumo em processo de industrialização ou produção rural, quando a saída do produto resultante não for tributada ou estiver isenta do imposto, exceto se tratar-se de saída para o exterior;
II – para comercialização ou prestação de serviço, quando a saída ou a prestação subseqüente não forem tributadas ou estiverem isentas do imposto, exceto as destinadas ao exterior.
§ 4º Deliberação dos Estados, na forma do art. 28, poderá dispor que não se aplique, no todo ou em parte, a vedação prevista no parágrafo anterior.
(…)
Da análise do dispositivo acima ressai que somente poderão ser consideradas passíveis de creditamento as mercadorias consumidas no desempenho de suas atividades, e desde que a operação seja tributada pelo ICMS.
Em relação à possibilidade de aproveitamento de créditos com esteio no art. 20 da Lei Kandir, a doutrina e a jurisprudência têm segregados os conceitos de mercadorias de “uso e consumo” e “mercadorias intermediárias”, entendendo que as primeira são aquelas não utilizadas diretamente na atividade de comercialização ou não empregadas no processo produtivo de industrialização do contribuinte, e como intermediárias aquelas consumidas na atividade-fim da pessoa jurídica, que são imprescindíveis e indispensáveis no processo produtivo do contribuinte.
Noutras palavras, a grande diferença entre as modalidades é que as mercadorias intermediárias são aquelas consumidas ou desgastadas no processo produtivo do contribuinte, tendo caráter imprescindível e essencial na produção de bens destinados à comercialização.
Em 2021, a primeira turma do STJ já havia proferido decisão favorável aos contribuintes, no julgamento do RESP nº 1.800.817/SP, em que considerou que a Lei Kandir permite o aproveitamento de crédito de ICMS referente à aquisição de quaisquer produtos intermediários, ainda que consumidos ou desgastados gradativamente, desde que seja comprovada a imprescindibilidade, essencialidade e relevância da mercadoria no processo produtivo.
Como pano de fundo do tema acima, há, ainda, discussão relativa ao limite temporal ao aproveitamento dos créditos apurados em relação as mercadorias destinadas ao uso ou consumo e energia elétrica para a partir 01/01/2033, imposto pelo art. 33, I e II da Lei Kandir. Em relação a citada discussão, o STJ[1] já se pronunciou favoravelmente aos contribuintes, no sentido de que a limitação temporal a utilização dos créditos não é extensível às mercadorias intermediárias, que são consumidas nas atividades de industrialização do produto acabado, sendo aplicável apenas às mercadorias de uso e consumo, que não são empregados no processo produtivo.
Trata-se de importante julgamento que poderá trazer segurança jurídica no aproveitamento de créditos de ICMS na aquisição de produtos intermediários utilizados no processo produtivo da pessoa jurídica, bem como e relevante benefício econômico aos contribuintes.
Nosso escritório está acompanhando o julgamento e se coloca à disposição para esclarecer eventuais dúvidas sobre o tema.
[1] STJ, Primeira Turma, Min. Rel. Gurgel de Farias, : AgInt nos EDcl Aresp nº 1.293.886/SC, j. 15/12/2020.