O controle de passivos ocultos é crucial dentro da gestão de riscos trabalhistas de qualquer empresa, que deseja evitar problemas financeiros e legais decorrentes de obrigações trabalhistas não registradas.
Atos de negligência e falhas involuntárias podem gerar passivos ocultos, colocando em risco a estabilidade financeira e a reputação da empresa. Por meio de práticas de gestão de risco e da adoção de medidas preventivas, é possível minimizar esses riscos e manter a conformidade com a legislação trabalhista.
O que é o passivo oculto?
De forma didática, passivo é aquele que “não age”. Ou seja, refere-se ao não cumprimento de obrigações trabalhistas que uma empresa possui. O termo “oculto” se aplica porque esses passivos estão “atrás das cortinas”, de modo que, embora possamos ver a cortina, não percebemos as sujeiras acumuladas no dia a dia.
Essas “sujeiras” podem ser vistas como má gestão, que pode resultar na falta de atenção ao controle dos procedimentos internos. Isso torna mais difícil detectar os erros da empresa e, assim, os passivos ocultos surgem quando as obrigações trabalhistas não são registradas oficialmente.
Esses registros não oficiais podem ser descobertos em processos trabalhistas, inspeções por órgãos de fiscalização ou auditorias, justamente porque, ao não serem devidamente registrados, não aparecem nos balanços financeiros da empresa.
Como se origina o passivo oculto?
Anísio Cândido Pereira, no artigo A Mensuração dos Passivos Ocultos, explica que o conceito de passivo oculto refere-se a:
“(…) obrigações contraídas pela empresa em práticas operacionais e comerciais usuais, às quais não estão vinculadas nas aquisições de bens e serviços, e oriundas de atos ou fatos abstratos que dificultam a mensuração e o reconhecimento da obrigação.” (p. 4).
Segundo a visão do especialista, as empresas estão sujeitas a gerar esses passivos por meio de atos de negligência ou ações involuntárias.
A negligência ocorre quando o gestor é ciente das obrigações, mas, por falta de ética, opta por ignorá-las, gerando danos. Já os atos involuntários surgem de falhas não intencionais, independentemente do gestor.
No mesmo artigo, Pereira cita alguns exemplos de atos de negligência que podem gerar passivos ocultos:
Passivos operacionais:
Ausência de manutenção de equipamentos de prestação de serviços, treinamento inadequado de operadores, ausência de manutenção das instalações de prestação de serviços, estocagem inadequada ou com prazo de validade vencida de produtos oferecidos ao consumo, qualidade de informação passada ao consumidor, não utilização de métodos que evitem doenças profissionais.
Passivos de consumo:
Utilização de materiais inadequados, utilização de componentes nocivos por ausência de testes, falhas de montagem, falhas de manipulação, falhas de acondicionamento, publicidade enganosa, apresentação insuficiente, apresentação inadequada.
Passivos ambientais:
Ações negligentes que provoquem efeitos climáticos, depleção da camada de ozônio, chuva ácida, qualidade do ar, danos advindos de metais pesados, odores resultantes de resíduos orgânicos voláteis, poluição sonora, gerenciamento do lixo dos resíduos de conteúdo tóxico, vazamentos poluidores, efeitos antiecológicos, qualidade de água.
Passivos éticos:
Fabricação de produtos nocivos como tabaco, álcool ou produtos compostos de drogas com efeitos colaterais comprovados.
A gestão de riscos trabalhistas, de forma adequada, pode evitar erros na administração dos direitos trabalhistas dos funcionários, como por exemplo, falhas no pagamento de benefícios, adicionais de periculosidade ou insalubridade.
Conheça as principais causas do passivo oculto
Tanto os atos de negligência quanto às ações involuntárias podem causar falhas na gestão. Por isso, identificar as causas do passivo trabalhista é o primeiro passo para preveni-lo. Entre as causas mais comuns estão:
- Documentação desatualizada ou incompleta;
- Falta de registro adequado de horários;
- Arquivamento incorreto de contratos, comprovantes e outros documentos relevantes;
- Não concessão dos intervalos obrigatórios previstos nos artigos 71 a 73 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT);
- Ausência de regimento interno, dificultando o monitoramento do cumprimento de normas jurídicas, de saúde e segurança;
- Violações de acordos coletivos ou individuais;
- Processos inadequados de admissão e demissão.
A ausência de um sistema eficiente para gerenciar documentos trabalhistas é uma das principais causas de passivos ocultos, como aponta o Jusbrasil. A desorganização pode levar à inversão do ônus da prova, situação em que, ao invés de o trabalhador ser obrigado a comprovar suas alegações (como o cumprimento de jornada), o empregador é quem precisará apresentar as evidências.
Empresas que não cumprem as legislações trabalhistas, seja por falta de informação, seja por falta de ética, podem causar prejuízos aos funcionários e comprometer sua própria saúde financeira.
Além disso, a inexistência de um regimento interno estruturado aumenta as chances de práticas desorganizadas, dificultando a fiscalização da ética nas relações trabalhistas e favorecendo violações de acordos, que podem resultar em passivos trabalhistas.
Para reconhecer e compreender as obrigações legais, é essencial implementar medidas alinhadas à legislação, garantindo maior controle e reduzindo custos associados a ações trabalhistas.
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Gestão de riscos trabalhistas e problemas no cumprimento das legislações
De acordo com o Tribunal Superior do Trabalho, a hora extra é o tema campeão na Justiça do Trabalho no primeiro semestre de 2023 no que se refere aos problemas com obrigações trabalhistas. Além disso, a página cita o seguinte trecho:
“O empregador acionado na Justiça do Trabalho que não apresenta os controles de frequência obrigatórios fica submetido a uma presunção favorável ao empregado sobre a jornada de trabalho que ele alegar. Isso significa que se alguém ajuizar uma reclamação trabalhista dizendo que trabalhou duas horas extras por dia durante todo o seu contrato de trabalho, caberá ao empregador provar o contrário, e não ao empregado demonstrar as horas trabalhadas.”
Em outras palavras, em uma reclamação trabalhista, se o empregador não apresentar os controles de frequência obrigatórios, o tribunal presume que a jornada de trabalho alegada pelo empregado é verdadeira, a menos que a empresa consiga provar o contrário.
Essa situação é conhecida como o princípio da “inversão do ônus da prova”, presente no Código de Defesa do Consumidor (CDC), no artigo 6º, inciso VIII, da Lei nº 8.078/90.
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Impactos do passivo trabalhista
Os prejuízos financeiros nas empresas são uma das consequências do passivo trabalhista, porque, além do caso trazer má reputação, existe a possibilidade de multas e custos altíssimos para a marca.
Como evitar os passivos ocultos?
A gestão de riscos trabalhistas permite identificar, avaliar e controlar riscos relacionados às obrigações trabalhistas em uma empresa. Assim, é possível garantir documentação correta, gestão de qualidade e preparação para uma futura ação trabalhista.
Por isso, algumas maneiras de manter a empresa regularizada são:
- Promover um bom controle de documentos regularizados;
- Adotar o gerenciamento da jornada de ponto;
- Desenvolver um regimento interno;
- Capacitar constantemente a equipe de recursos humanos;
- Ter um canal de denúncias;
- Realizar auditorias internas regulares;
- Garantir o cumprimento das normas legais, normativas e coletivas
- Apostar na advocacia preventiva.
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Importância de cuidar dos colaboradores
A gestão de riscos trabalhistas e a análise do passivo oculto vão além dos números. É preciso olhar para as pessoas para, obviamente, manter seus direitos trabalhistas em dia e cumprir com as obrigações, mas também garantir o cuidado que elas precisam durante sua jornada com a empresa.
Elie Horn, fundador da Cyrela, comentou, em uma entrevista para Revista Época Negócios:
“Quando o pessoal da empresa vê você fazendo coisas boas, eles vão te seguir. O chefe é muito visado e depende dele a cultura. Tem isso na Cyrela. Tem voluntariado. Tem o bem.(…)Essa sensação de bem-estar, de alegria, de felicidade… é indescritível. Faz você dar valor ao trabalho, ao que ele pode proporcionar.”
O empresário concluiu que a conexão entre as pessoas é o que move a empresa.
“Descobri cada vez mais que eu tomo decisões sobre pessoas. Já passei a minha fase, no ano passado, de ser o presidente chato, o cara que liga para todo mundo perguntando como está isso, como está aquilo. Essa mania de tentar controlar tudo, entender tudo, foi dando espaço para uma dinâmica de apostar mais nas pessoas e delegar com confiança, sabendo que o conhecimento está nelas(…)Não dá para controlar tudo.”
Sobre o BVP
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