Por Thiago Vieira de Almeida Prado, Luisa Carolina Aki Toyoshima e Isabella Piacci Mercado
“Adquirir ou comprar uma empresa” ou “passar o ponto ou o negócio” são termos comumente utilizados no linguajar popular, seja no meio empresarial ou fora, que, quando utilizados sem consciência de seu aspecto jurídico, podem gerar questionamentos e equívocos conceituais quanto às operações de fato envolvidas.
O objetivo do presente artigo é apresentar as diferenças entre a Cessão de Quotas e a Alienação de Estabelecimento Empresarial, conhecida como “Trespasse”, de forma prática e conceitual, com o intuito de melhor compreender seus escopos e as peculiaridades que diferenciam um instituto do outro.
O complexo de bens organizados com a finalidade de permitir o exercício da atividade empresarial é denominado estabelecimento comercial. Tal complexo pode ser composto por bens corpóreos, abrangendo, por exemplo, mercadorias, instalações, equipamentos, veículos e maquinários, ou incorpóreos, abrangendo a marca, patente, ponto, segredos industriais, dentre outros.
Por diversos motivos, é possível que o estabelecimento comercial seja alienado pelo empresário ou pela sociedade empresária a um terceiro interessado em dar continuidade ao negócio. Nessa hipótese, tem-se o Trespasse, operação que, mediante o pagamento de contraprestação, termina com a troca da titularidade do estabelecimento, operando como uma compra e venda. Para que tenha eficácia perante terceiros, o contrato firmado deverá ser registrado na Junta Comercial competente e publicado na imprensa oficial.
O Trespasse sempre terá como objeto o conjunto de bens necessários para o exercício regular da atividade empresarial. De outro modo, a alienação pontual de bens não possui natureza de Trespasse, constituindo uma simples alienação. Quando se pensa em operações desta natureza, deve-se sempre ter em mente a continuidade do negócio. Na prática, é como se uma sociedade, por exemplo, passasse a outra o ponto ou o negócio propriamente dito, o que não implica dizer que a sociedade está sendo vendida.
Para evitar situações de concorrência desleal, a legislação nacional proíbe que, dentro do período de 05 (cinco) anos, o alienante faça concorrência com o adquirente, no mesmo ramo do negócio alienado, salvo se as partes acordarem por escrito expressamente de forma diversa.
Com a alienação, o adquirente passará a responder pelas dívidas e obrigações, regularmente contabilizadas no momento da escrituração, contraídas antes da transferência de titularidade, prevendo a lei responsabilidade solidária entre as partes pelo período de 01 (um) ano a partir da publicação da operação na imprensa nacional, quanto aos créditos vencidos, e da data do vencimento, quanto aos demais créditos. Exclui-se desta regra as obrigações e dívidas de natureza tributária e trabalhista que deverão obedecer a regramento próprio.
Por último, a regra é pela sub-rogação automática de contratos relacionados à exploração da atividade empresarial, desde que não possuam natureza pessoal. Sem prejuízo desta regra, os terceiros podem vir a rescindir tais contratos em até 90 (noventa) dias após a publicação da operação na imprensa, se houver justa causa, ressalvada, neste caso, a responsabilidade do alienante (antigo dono do “ponto”).
Uma vez explicado o conceito de Trespasse, partiremos para a análise do instituto da Cessão de Quotas, definida como a operação na qual um sócio cede, parcial ou integralmente, onerosa ou gratuitamente, quotas sociais a outro sócio ou a terceiro.
Diferentemente do que ocorre no Trespasse, são partes da relação os sócios ou o sócio cedente e o terceiro, ficando a sociedade alheia nesse sentido. Ademais, o objeto da cessão envolve exclusivamente as quotas da sociedade. Como se pode ver, as diferenças entre o objeto e as partes envolvidas dos institutos analisados por este artigo são notáveis.
A principal implicação societária de uma cessão de quotas operada entre sócios é a alteração da participação societária da sociedade. Já a cessão de quotas para terceiro implica, também, na alteração de seu quadro social. Em ambos os casos será necessário que o Contrato Social da sociedade seja atualizado mediante sua alteração e arquivamento na Junta Comercial competente. Tal fenômeno não acontece na operação de Trespasse, tendo em vista que não há alteração no quadro societário do alienante e adquirente.
Lembra-se que o sócio cedente responderá, de forma solidária, com o cessionário pelo período de 02 (dois) anos, contados da data de averbação/arquivamento da modificação do Contrato Social na Junta Comercial, por todas as obrigações que tinha até o momento de sua saída.
Especialmente em relação às sociedades limitadas, por haver preponderância do vínculo entre os sócios nas decisões sociais (affectio societatis), a legislação brasileira estabelece que, diante do silêncio do Contrato Social, a cessão de quotas para terceiro possui como requisito negativo a ausência de oposição de sócios que representem mais de 25% (vinte e cinco por cento) de seu capital social.
Dito o acima, em que pese a confusão entre os contratos de Cessão de Quotas e Trespasse ser comum, são figuras contratuais diferentes e que envolvem partes, objeto e finalidades próprios.